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domingo, 18 de julho de 2010

O tamanho do Estado é documento?

Nos últimos cem anos, o Brasil oscilou entre governos com pouca intervenção na vida pública até os que fizeram da estatização um modelo político. Mas por que isso é importante?

Quem tem problema de peso deve saber o que é efeito sanfona. O sujeito está gordo, faz um regime, e fica magro como queria. Depois, descuida e lá vem o excesso de peso de novo. Com o Estado, no Brasil, tem sido assim também. No último século, o país oscilou várias vezes entre um Estado forte e sua versão mais magra. E a cada vez que o governo pende muito para um lado aparece alguém defendendo que é preciso inverter o movimento, puxando para o outro.

Na atual eleição, o tamanho ideal do Estado parece ser um dos temas mais quentes em debate. Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) ainda não entraram de cabeça no assunto, mas têm cutucado uns aos outros sobre as posições clássicas de seus partidos (veja quadro nesta página). Para entender exatamente o que está em jogo, porém, é preciso explicar quais os argumentos a favor de um Estado forte e a favor de um Estado magro.

O Brasil já viveu os dois modelos. “O auge do governo forte foi na época do [presidente] Ernesto Geisel [1974 a 1979]”, afirma o historiador Marco Antônio Villa, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Paulo. O governo Geisel, em cinco anos, criou bancos, estatais de siderurgia, telefonia, energia elétrica, transportes e usinas nucleares. O Estado inchou a ponto de ter até hotéis. Até que a bolha estourou.

O excesso de gastos, entre outros efeitos, trouxe a hiperinflação. A burocracia ficou tão grande que foi preciso criar mais o inédito Ministério da Desburocratização. E o governo não tinha mais pernas nem mesmo para resolver problemas imediatos. Foi quando o pêndulo começou a andar para o outro lado.

O emagrecimento começou no redemocratização e andou mais rápido no governo Fernando Collor [1990 a 1992]. Itamar Franco [1992 a 1994] e Fernando Henrique Cardoso [1995 a 1998 e 1999 a 2002] continuaram o regime. O programa de privatizações foi o que mais marcou: todo o sistema de telefonia, parte do sistema energético, a Vale do Rio Doce e a Companhia Siderúrgica Nacional foram vendidos. O Estado ficou magro – e surgiram outros problemas. Sem forças, o governo não tinha como induzir crescimento. Faltavam empregos e programas sociais mais incisivos.

“Até o início do primeiro mandato de Lula, esse modelo continuou”, afirma o cientista político Adriano Codato, da UFPR. Só aa partir de 2005, segundo ele, o pêndulo começou a se voltar para o outro lado. Desde lá, o governo voltou a criar estatais (foram 12 até o momento, incluindo a do Pré-Sal, uma de seguros e a do trem-bala) e a contratar funcionários. A máquina cresceu de novo: só nos dois governos Lula, foram contratados 127 mil funcionários para o governo federal.

Pêndulo

Para que lado o pêndulo deve ir agora? Em teoria, PT e PSDB têm visões bastante diferentes sobre o tema. Afinal, o PSDB de José Serra foi responsável por privatizações enquanto o PT de Dilma Rousseff tem justamente feito o caminho contrário. Marina Silva, por sua vez, tem tentado se firmar como uma terceira via, defendendo um “Estado eficiente”, como se o tamanho, propriamente, não fosse o ponto central da discussão.

“Mas não parece que os três candidatos que estão aí têm visões tão diferentes entre si”, afirma o filósofo Roberto Romano, professor de Ciência Política da Unicamp. Pelo menos, no que diz respeito a defender um Estado forte em algum sentido. “A diferença é que a Dilma vai mais longe em alguns pontos. Além de defender um Estado regulador, ela acredita em um Estado que intervém em vários setores”, comenta.

“Os três candidatos que estão aí devem manter o pêndulo no mesmo movimento do governo Lula”, afirma Adriano Codato. “Enquanto houver dinheiro no caixa do governo, essa deve ser a tendência. Até porque uma parte importante do tamanho do Estado hoje está na política de assistência aos muito pobres, e a população não iria aceitar um candidato que se propusesse a diminuir esse tipo de gasto”, diz o professor.

Não é só o contexto econômico nem é só a situação política do país que levam a crer que um Estado grande, com máquina pesada, deve ser mantido nos próximos anos. Mesmo se não ganhar Dilma, tida como a mais tendente à intervenção na economia dentre os três candidatos, o presidente eleito não deve ser alguém com perfil liberal.

José Serra, dentro do PSDB, é considerado um “estatista”, e já tem dito que está à esquerda de Lula. Marina também tem origem na esquerda, que usualmente defende um Estado forte e interventor para poder implantar políticas de redução de desigualdade.

Curiosamente, apesar disso, os candidatos continuam se alfinetando sobre esse ponto em seus discursos. Em parte, a motivação para levar o debate para esse lado vem do PT, que gosta de acusar o PSDB de privatista. Em parte, vem da vontade de Serra de agradar a seus aliados liberais, do DEM, que querem cortes de gastos e de impostos no governo.

“Não me lembro de uma eleição na História do Brasil em que este tema tenha tido peso tão grande”, afirma Villa, da UFSCar. Mudanças, porém, só no próximo movimento do pêndulo. Que ninguém sabe ainda quando virá. Fonte: Gazeta do Povo, reportagem de Rogerio Waldrigues Galindo

Efeito sanfona
De acordo com o professor Adriano Codato, da UFPR, nos últimos cem anos o mundo viveu quatro “temporadas” em relação ao tamanho do Estado. Entenda:

Até 1930

Antes da quebra da Bolsa de Nova York, em 1929, o Estado tinha muito menos atuação do que hoje. Respondia apenas pelas funções de segurança nacional e alguns serviços como saúde e educação.

De 1930 até o fim dos anos 1970

A Grande Depressão e o surgimento da União Soviética exigiram que os governo ocidentais reagissem e se tornassem maiores. Era preciso mostrar que o Estado capitalista também podia dar conforto a seus cidadãos e fazer as economias crescerem. Nos EUA, o New Deal do presidente Franklin Delano Roosevelt (foto 1) se torna um modelo: o governo intervém na economia em várias novas áreas.

Fim dos anos 1970 a 2000

A reação dos liberais começa. Surge a teoria do Estado mínimo: o governo deve ser o menor possível, para não pesar no bolso dos cidadãos nem atrapalar o desenvolvimento natural do mercado. Margaret Thatcher (foto 2) faz uma reforma liberal na Grã-Bretanha. Ronald Reagan, nos EUA, diz que o governo não é a solução: é parte do problema. Em 1990, o Consenso de Washington sugere que os países em desenvolvimento devem ter políticas liberais.

2008 até hoje

Um novo ciclo começa. O governo dos EUA é obrigado a socorrer os capitalistas após a crise financeira mundial. Barack Obama (foto 3), que estabeleceu uma política de atendimento universal de saúde e regulou o sistema financeiro é um símbolo da volta de um Estado mais forte. No Brasil, o modelo também vem mudando para a política de um Estado mais forte sob Lula.

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